V.23, nº 51 - 2025 (maio-agosto) ISSN: 1808-799 X


O ESPORTE E SUA INFLUÊNCIA NA ESCOLHA PROFISSIONAL DE PROFESSORAS UNIVERSITÁRIAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA1


Carla Chagas Ramalho2 Nágilla Santa Rosa Cordeiro3

Resumo

Este estudo analisa a influência do esporte na escolha profissional de docentes de Educação Física, considerando as determinações do modo de produção capitalista e as relações estruturais do sistema sexo/gênero. A pesquisa, baseada no materialismo histórico-dialético, utiliza entrevistas com docentes de uma universidade pública do Norte de Minas Gerais. Demarca-se a apropriação dialética do esporte pelo MPC, que reforça a alienação e a divisão sexual do trabalho. Conclui-se que uma abordagem crítica do esporte auxiliará na conscientização de classe e na superação das opressões de gênero.

Palavra-chave: Modo de Produção Capitalista; Mulher; Esporte.


EL DEPORTE Y SU INFLUENCIA EN LA ELECCIÓN PROFESIONAL DE PROFESORAS UNIVERSITARIAS DE EDUCACIÓN FÍSICA

Resumen

Este estudio analiza la influencia del deporte en la elección profesional de docentes de Educación Física, considerando las determinaciones del modo de producción capitalista y las relaciones estructurales del sistema sexo/género. La investigación, basada en el materialismo histórico-dialéctico, utiliza entrevistas con docentes de una universidad pública del norte de Minas Gerais. Se señala la apropiación dialéctica del deporte por el MPC, que refuerza la alienación y la división sexual del trabajo. Se concluye que un enfoque crítico del deporte ayudará en la concienciación de clase y en la superación de las opresiones de género.

Palabra clave: Modo de Producción Capitalista; Mujer; Deporte.


SPORT AND ITS INFLUENCE ON THE PROFESSIONAL CHOICE OF UNIVERSITY PHYSICAL EDUCATION TEACHERS

Abstract

This study analyzes the influence of sports on the professional choice of Physical Education teachers, considering the determinations of the capitalist mode of production and the structural relations of the sex/gender system. The research, based on historical-dialectical materialism, uses interviews with teachers from a public university in northern Minas Gerais. It highlights the dialectical appropriation of sports by the CMP, reinforcing alienation and the sexual division of labor. It concludes that a critical approach to sports will help raise class awareness and overcome gender oppression.

Keywords: Capitalist Mode of Production; Woman; Sport.


1Artigo recebido em 29/01/2025. Primeira Avaliação em 28/05/2025. Segunda Avaliação em 24/05/2025. Aprovado em 24/07/2025. Publicado em 06/08/2025.

DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v23i51.66397.

2Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Brasil. Docente efetiva Universidade Estadual de Montes Claros. Email: carlaramalho.ccr@gmail.com.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/3637197719291948. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6263-2498. 3Graduada e Licenciada em Educação Física pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), Minas Gerais - Brasil . Servidora pública da prefeitura de Montes Claros.

Email: nagillacordeiro96@hotmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/4517549047286952. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0155-6230.

Introdução


O trabalho em sua condição ontológica, entendido como toda modificação da natureza para atender às necessidades humanas, é central na teoria marxista para analisar o modo de produção capitalista (MPC). Marx e Engels definem o trabalho como o elemento que distingue os seres humanos dos primatas (Engels, 1999). Assim, o objeto de estudo de Marx é a produção material, realizada “[...] em sociedade – por isso, o ponto de partida é, naturalmente, a produção dos indivíduos socialmente determinada” (Marx, 2011a, p. 39).

No MPC, a totalidade do trabalho é estranhada e a venda da força de trabalho (FT) transforma-se como forma de subsistência para a classe trabalhadora, que efetivamente modifica a natureza. Esse processo leva à alienação do trabalho ontológico, onde a atividade humana deixa de ser um meio de realização e torna-se apenas uma condição de sobrevivência. Assim, a escolha de um emprego passa a ser determinada pelas experiências individuais e pela necessidade de subsistência, desconectando o trabalho de seu significado ontológico (Marx, 2017).

Esse distanciamento do significado ontológico do trabalho é reforçado pelo (e reforça o) MPC, que organiza as relações sociais para incentivar a individualização e obscurecer a totalidade das relações humanas. Nesse contexto, a reificação das condições sociais do trabalho dificulta a percepção da exploração e da interdependência entre os indivíduos (Netto; Braz, 2009). As relações sociais no MPC moldam a interação constante entre resistência e conformismo diante da exploração, e, nesse cenário, as opressões de gênero direcionadas às mulheres desempenham um papel importante. O MPC utiliza estereótipos e constructos diferenciados para direcionar a FT de homens e mulheres de acordo com suas necessidades econômicas.

As manifestações das opressões de gênero também podem ser constatadas através do esporte, atividade cultural influenciada pelo modo de produção vigente. No Brasil, o Decreto-lei 3.199/1942 proibiu mulheres de praticar determinadas atividades esportivas, consideradas "inadequadas" à "natureza" feminina. Essa proibição reflete a forma como as práticas esportivas são moldadas por expectativas sociais e ideológicas burguesas. Embora o esporte seja uma criação humana (Soares et al., 1992), ele foi apropriado pelo MPC e passou a reforçar a conformidade e a

competição, práticas necessárias no capitalismo industrial (Castellani Filho, 2013). Originalmente uma expressão de ludicidade, o esporte tornou-se instrumentalizado para sustentar dinâmicas de poder e hierarquizações sociais.

Diante desse contexto, este estudo tem como objetivo analisar de que forma a participação no esporte influenciou a escolha profissional de docentes universitárias de Educação Física (EF) em uma universidade pública do Norte de Minas Gerais, considerando as determinações do MPC e as relações estruturais do sistema sexo/gênero. A pesquisa busca compreender como essas experiências impactou a trajetória profissional das mulheres pesquisadas no campo esportivo e educacional, bem como as contradições que emergem dessa inserção.

A pesquisa justifica-se pela relação entre a formação profissional das mulheres e o esporte, considerando o aumento da prática esportiva entre mulheres no Brasil (Brasil, 2022) e sua maior participação no mercado de trabalho (IPEA, 2015). Esses fatores sugerem uma ampliação da presença das mulheres no espaço público, seja na prática esportiva ou na venda de sua FT.

Para apresentar de forma didática e compreensível os dados empíricos, este artigo parte da compreensão teórica de conceitos basilares sobre o MPC, o esporte e as relações do sistema sexo/gênero, articulando-os à realidade das docentes entrevistadas.


O modo de produção capitalista e a mulher


A partir da acumulação primitiva, o MPC se consolida como sistema hegemônico na sociedade moderna. Marx (2017) descreve esse processo como um verdadeiro “pecado original”, comparável à narrativa cristã, no qual, por meio da violência e da exploração, se constituiu uma classe que acumula riquezas sem trabalhar, enquanto a maioria, despossuída, só tem a própria força de trabalho (FT para vender: "Deu-se, assim, que os primeiros acumularam riquezas e os últimos acabaram sem ter nada para vender, a não ser sua própria pele" (Marx, 2017, p. 959). Essa divisão histórica deu origem a uma estrutura social baseada na propriedade privada, na herança e no controle da reprodução. Engels (2019) destaca que a família monogâmica foi uma das formas criadas para garantir a transmissão de bens e a continuidade da classe dominante, reforçando, assim, a heterossexualidade como norma. Além disso, o controle dos corpos das mulheres, especialmente das

proletárias, permanece como um mecanismo funcional ao MPC, servindo para regular a oferta de força de trabalho (FT) Em países periféricos, restrições como a criminalização do aborto aprofundam essa lógica, afetando diretamente a autonomia reprodutiva das mulheres (ANIS, 2017).

Esse controle sobre os corpos sexuados das mulheres proletárias está diretamente ligado à lógica de funcionamento do MPC, que se beneficia da existência do exército industrial de reserva e da população excedente como estratégias para regular o valor da FT da classe trabalhadora. Ao ampliar o número de pessoas disponíveis para substituir aquelas já empregadas (exército de reserva), ou ao manter uma parcela significativa da população trabalhadora sem condições reais de vender sua FT, por exceder as vagas disponíveis, mas pressionando a concorrência entre trabalhadores(as) (população excedente). A classe capitalista – única detentora dos meios de produção – se beneficia da pobreza estrutural para manipular e controlar o proletariado (Marx, 2017).

Uma analogia simples ajuda a visualizar essa relação: a classe capitalista é a dona da bola, do campo e de todos os recursos necessários para o jogo acontecer. Já a classe trabalhadora é composta por aqueles que efetivamente fazem o jogo andar. Poucos têm a chance de jogar, mas todos sabem que podem ser substituídos(as) a qualquer momento pelos que estão no banco de reservas (exército industrial de reserva). Enquanto isso, outros(as) permanecem apenas como espectadores(as) à margem do campo – pressionando quem está jogando, mas sem sequer ter a chance real de participar da partida – representando a população excedente.

Para manipular esse quantitativo populacional, o controle sobre os corpos das mulheres (únicas capazes de gestar e parir) torna-se estratégico na lógica de regulação do MPC. Esse controle se materializa por meio do sistema sexo/gênero, que relaciona o corpo das mulheres às expectativas e exigências sociais. É esse sistema que, no interior do MPC, transforma as diferenças sexuais reais entre homens e mulheres em desigualdades sociais. Por meio da ideologia burguesa, o MPC constrói idealizações sobre o papel e a existência das mulheres, subordinando suas funções biológicas (sexo) às necessidades sociais impostas (gênero) (Saffioti, 2015).

O MPC se apropria dessas diferenças biológicas para justificar desigualdades entre os grupos sexuais. Embora sejam justamente as mulheres as responsáveis pela

continuidade da espécie humana, sua FT é historicamente desvalorizada, tratada como inferior na lógica da compra e venda da FT. Como já apontava Marx (2017), mulheres e crianças, por suas condições biológicas específicas, eram tradicionalmente as detentoras dos trabalhos mais mal remunerados, justamente por não serem homens – ou seja, o macho adulto da espécie humana.

Enquanto os meninos crescem e se tornam homens, as meninas crescem e se tornam mulheres – e, para o MPC, esse ciclo já define um destino: mulheres são vistas como FT mais barata e como corpos destinados a produzir mais trabalhadores e trabalhadoras. Essa lógica impacta diretamente as condições reais e materiais de vida das proletárias, limitando suas possibilidades históricas dentro dessa estrutura social. Assim, analisar as opressões direcionadas às mulheres, especialmente às da classe proletária, bem como as restrições legais impostas a elas, é indispensável para compreender como o MPC opera em diferentes tempos e espaços, articulando-se à totalidade do sistema.


O modo de produção capitalista e o esporte


O esporte é uma das ferramentas utilizadas para promover os ideais capitalistas, pois, na sociedade moderna, reforça princípios como a meritocracia e a competitividade (Castellani Filho, 2013). Na década de 1980, Castellani Filho (1988) destacou que era comum a recomendação de que fábricas e empresas oferecessem espaços esportivos. Esses ambientes não visavam apenas preparar fisicamente os(as) trabalhadores(as), mas também criar uma sensação de pertencimento e adaptação ao modo de produção e efetiva a prática competitiva na cultura de todos(as).

"... No caso da iniciativa privada, é preciso interessá-la, há que mostrar a necessidade da dinamização desportiva da massa que utiliza, para conseguir, através disso, um sorriso em lugar de um rosto fechado, a alegria substituindo a contrariedade e a angústia. O resultado será, sem dúvida, a cooperação em vez da omissão, a produção em vez da inércia ou do descontentamento. Teremos, assim, conseguido um inteligente investimento em termos de humanismo..." (Gonçalves, 1978, p. 39 apud Castellani Filho, 1988, p. 90, grifo nosso).


No contexto do MPC, a prática esportiva assume uma função anestésica, contribuindo para o conformismo, competição e a perpetuação das desigualdades

estruturais. Sua capacidade de canalizar esperanças e frustrações para um “universo mágico” foi amplamente explorada (Castellani Filho, 1988). Seja no esporte de alto rendimento, no recreativo ou nas práticas voltadas à saúde, a ludicidade proporciona alívio tanto para praticantes quanto para espectadores(as), reforçando, assim, a alienação característica do MPC. Penna (2011) ressalta que a visão hegemônica do esporte como algo universalmente positivo mascara sua função alienante. O discurso de inclusão e diversidade frequentemente esconde a reprodução das lógicas capitalistas, evidenciando que “[...] os ideólogos da suposta liberdade burguesa que só existe quando vinculada à propriedade privada” (Penna, 2011, p. 160).

Para as mulheres, a prática esportiva reflete as transformações contraditórias e dialéticas exigidas pelo MPC. Como aponta Goellner (2006, p. 92):

A ampliação da participação feminina em diferentes espaços sociais, dentre eles os esportivos, não se deu sem a presença de conflituosas reações, pois simultaneamente mesclava-se a herança de um recente passado colonial, agrário e cristão e o devir de um futuro moderno, industrial e não menos cristão de forma a equiparar duas exigências complementares e contrapostas: a permanência da mulher no lar porque mãe e guardiã dos valores morais da família e a sua fluência na rua porque integrante de uma cidade que principiava a oferecer extraordinárias novidades de consumo e diversão.


Mesmo sem o foco para as demandas do MPC, Goellner (2006) destaca a dialeticidade da reorganização social imposta às mulheres pelas novas estruturas tardias da produção capitalista no Brasil.

De maneira geral, o movimento dialético no esporte é perceptível, revelando que as relações sociais não são apáticas. A prática esportiva, além de anestésica, pode ter um potencial crítico. Um exemplo marcante são as Olimpíadas de 1968, no México, onde os corredores norte-americanos Tommie Smith e John Carlos ergueram os punhos cerrados, simbolizando a luta pelos direitos civis e pelos Panteras Negras. Outros episódios incluem o cancelamento dos Jogos Olímpicos durante as 1ª e 2ª Guerras Mundiais e o boicote dos EUA aos Jogos de Moscou em 1980, durante a Guerra Fria.

No que diz respeito às mulheres e ao esporte, exemplos recentes ressaltam as desigualdades. Em 2021, a seleção feminina de handebol de praia da Noruega foi multada por utilizar shorts em vez de biquínis. Marta, jogadora da seleção brasileira de futebol feminino, também chamou atenção para a desigualdade salarial entre homens e mulheres ao usar chuteiras sem patrocínio, estampando a mensagem “Go

equal”. Ambas as situações expõem como, também no esporte, há objetificação sexualizada dos corpos das mulheres como a desvalorização da sua FT comparada com a dos homens, de maneira semelhante ao que Marx (2017) e Engels (2010) observaram nas fábricas durante seus estudos sobre a exploração do trabalho.

Alinhada a essa lógica, a lista da Forbes (revista de negócios e economia) de 2025 com os atletas mais bem pagos do mundo apresenta apenas homens entre os dez primeiros colocados, representando diferentes modalidades (futebol, boxe, futebol americano, beisebol, entre outros) (FORBES, 2025). Esse cenário reflete como o MPC precisa se naturalizar em todas as relações sociais para manter sua hegemonia. Assim, o esporte, seja enquanto espaço de comercialização da FT, seja como veículo de propagação de idealizações capitalistas, também cumpre um papel social importante na reprodução dessas desigualdades.

Embora o esporte, de forma geral, atenda majoritariamente às necessidades hegemônicas, ele possui um potencial dialético para conscientizar a classe trabalhadora, desde que utilizado criticamente. No entanto, esse potencial só será plenamente realizado em um contexto de emancipação humana (Penna, 2011). Até lá, as práticas esportivas acríticas continuarão reforçando as prerrogativas capitalistas, como a propriedade privada e a competição, naturalizando sua presença nas relações sociais.


Procedimentos metodológicos


Neste estudo, foi adotado o método do materialismo histórico-dialético (MHD), que tem como premissa a contextualização e compreensão da totalidade em sua complexidade e contradições (Marx, 2017; 2011a). O movimento contínuo das relações sociais é analisado em conexão direta com a materialidade e a historicidade dos processos, permitindo uma visão mais ampla das dinâmicas sociais (Netto, 2011). Desenvolvido por Marx e Engels, o MHD se destaca por sua abordagem crítica, que considera o objeto em sua totalidade, analisando-o como parte de um conjunto de relações históricas e materiais.

Para alinhar-se a esse método, este artigo utiliza o sistema sexo/gênero como base teórica, definido como:

[...] sistema institucionalizado que distribui recursos, propriedade e privilégios a pessoas de acordo com papéis de gênero definidos culturalmente. Assim, o sexo determina que mulheres devem ter filhos, e o sistema sexo-gênero afirma que elas devem criar os filhos (Lerner, 2019, p. 321).

O MHD possibilita a aplicação de diversos instrumentos de pesquisa, desde que o objeto de estudo seja analisado em sua totalidade e limitações. Para este estudo, foi utilizada a entrevista semiestruturada como metodologia, uma ferramenta eficaz para explorar pontos cruciais da investigação. As entrevistas foram realizadas com professoras efetivas do Departamento de Educação Física e Desporto de uma universidade pública no Norte de Minas Gerais, durante o segundo semestre de 2019. Das oito docentes convidadas, uma optou por não participar.

As entrevistas foram previamente agendadas, gravadas e transcritas. Após a coleta, os relatos foram organizados em categorias, sendo destacada neste artigo a categoria relacionada ao esporte. Nessa análise, foram selecionados relatos e informações que evidenciam a relevância do esporte na escolha profissional dessas docentes. Para preservar o anonimato, as entrevistadas foram identificadas com nomes de deusas da mitologia grega: Afrodite, Atena, Bia, Íris, Maia, Hebe e Heras. Abaixo, apresenta-se a relação entre o período de nascimento e a graduação das entrevistadas, o que contribui para contextualizar suas falas e vivências.

Tabela 1 – Período de nascimento e graduação em EF das professoras entrevistadas



Período de nascimento

Período da graduação

Afrodite

1975 – 1979

1998 – 2002

Atena

1980 – 1984

2001 – 2007

Bia

1970 – 1974

1996 – 2000

Íris

1985 – 1989

2004 – 2009

Maia

1970 – 1974

1991 – 1994

Hebe

1980 – 1984

2001 – 2004

Heras

1975 – 1979

1997 – 2001

Fonte: Elaboração própria


A influência do esporte para as docentes universitárias


A institucionalização do esporte no Brasil, dentro do MPC, foi diretamente influenciada pelo governo centralizador de Getúlio Vargas, que buscava disciplinar a população para atender às demandas da industrialização e modernização gradual do país (Castellani Filho, 2013). O primeiro documento legal com essa premissa foi o já

citado Decreto-lei 3.199/1941, que proibia às mulheres algumas práticas esportivas com a justificativa de serem contrárias à sua “natureza” (Brasil, 1941). Tal medida reforçava o patriarcado, entendido como o uso de instituições sociais para subordinar as mulheres (Lerner, 2019).

Nesse período do MPC, o disciplinamento dos corpos da classe trabalhadora, promovido por meio do esporte, era prioritariamente direcionado aos homens, enquanto as mulheres eram relegadas a funções e responsabilidades alinhadas às demandas do sistema. Essa separação reflete a divisão sexual do trabalho no MPC, que também se manifesta na institucionalização das práticas esportivas.

Esportes como a ginástica de aparelhos, envolvendo barras paralelas, fixas, argolas e cavalo de pau, eram considerados inadequados para as mulheres. O futebol, por sua vez, era amplamente rejeitado para elas, sob a justificativa de que, por ser um esporte de contato físico intenso e exigir alto condicionamento físico e técnico, poderia causar lesões e comprometer tanto a saúde reprodutiva quanto a aparência de feminilidade, de acordo com as ideologias predominantes da época (Silva; Fontoura, 2011).

Essa lógica evidencia que desconsiderar o corpo sexuado nas análises históricas significa negligenciar não apenas a trajetória das mulheres no esporte, mas também seu lugar na sociedade como um todo.

Com o passar do tempo e as mudanças nas fases do MPC, a inserção de mulheres da classe trabalhadora no mercado de compra e venda de FT foi incentivada, assim como a ampliação de seus espaços e atribuições sociais. Nesse contexto, em 1983, o Conselho Nacional de Desportos (CND) reconheceu oficialmente a prática do futebol feminino (Westin, 2023), regularizando a atividade que já ocorria informalmente, mas sem apoio estatal. Esse reconhecimento, embora tardio, serviu como forma de tutela organizativa, reforçando o controle da classe dominante sobre as práticas esportivas das mulheres.

Esse período coincide com a infância e adolescência da maioria das entrevistadas, com exceção de uma que ainda não havia nascido. A legalização e regulamentação da prática esportiva para as mulheres, promovidas pelo Estado e por instituições no âmbito do MPC, impactaram diretamente todas as entrevistadas. Além disso, a nova organização social voltada à sustentação do MPC passou a exigir a

presença das mulheres no mercado de trabalho, com o objetivo de regular e reduzir o custo de toda a FT.

Esse contexto pode ter influenciado o fato de cinco das sete participantes terem indicado afinidade com as manifestações esportivas como motivação para a escolha profissional. Entre as que não associaram o esporte diretamente à escolha, Afrodite relatou que sua decisão foi motivada pelo interesse na dança, enquanto Heras mencionou o desejo de seguir a carreira docente, vendo na EF uma oportunidade de atuar na área educacional. As falas a seguir ilustram a relação das demais docentes com o esporte.

Eu sempre gostei de esporte e decidi que na Educação Física ia marcar as coisas que eu gostava. Meu pai era jogador de futebol, então... (Atena)

Na verdade, ela se deu pautada na família, que é uma família de educadores físicos, fisioterapeutas. Na verdade, foi isso, vendo meus primos na época em uma cidade pequena, era maravilhoso ver eles uniformizados indo para os clubes, academias, e assim... Foi onde eu me apaixonei assim... Paixão de infância. (Maia)


A minha mãe… Meus pais, né... mas minha mãe em especial sempre teve uma preocupação em aproximar os filhos, né... no caso meu irmão mais velho e eu é… De esportes, por ela ter tido o histórico de problema de saúde cardíaco e ter dificuldade de participar de esportes e tal. Então ela queria que os filhos dela jamais passassem por isso né? (Íris)

Sempre, sempre fazia aulas de Educação Física com minha mãe. Eu lembro que eu estudava de tarde e de manhã eu fazia os cinco horários no colégio que ela dava aula, chegava em casa, almoçava e ia para a escola. Então, assim, sempre a Educação Física estava envolvida... [...] Sim, [minha mãe é professora] de educação física. E aí ela já atuava em escola, e também atuou em academia de tênis, no Minas Tênis Clube com curso básico de esportes. Então ela sempre esteve envolvida também tanto no setor escolar quanto no setor de clubes e iniciação esportiva. (Hebe)


As experiências compartilhadas pelas professoras revelam momentos significativos de vivência e convivência proporcionados pela prática esportiva, seja por questões de saúde, esporte de rendimento ou recreativo (Castellani Filho, 2013). Contudo, nenhuma das docentes apontou diretamente a prática esportiva como influente na manutenção ou resistência ao MPC. Todas enfatizaram que a prática esportiva disponível naquele período atendia finalidades específicas de manutenção, como saúde, integração familiar, status social ou atuação profissional. Nenhuma

atribuiu à prática esportiva um papel transformador ou ligado a um contexto social mais amplo, mas sim a demandas individuais. Isso pode indicar limitações na aplicação das práticas esportivas como instrumentos de modificação social.

Como destaca Penna (2011), quando o esporte não é apresentado ou vivenciado de forma crítica ao MPC, suas práticas acabam, inevitavelmente, reproduzindo as lógicas exploratórias desse sistema. Isso fica evidente nos relatos das participantes: Atena, por exemplo, falou da forte influência do pai, que era jogador de futebol e, para ela, uma referência direta de venda da FT. Maia afirmou admirar a disciplina e a padronização que via nos familiares durante a prática esportiva, sem questionar as hierarquizações envolvidas. Íris associou o esporte a uma vida ativa, mas sem refletir sobre como a saúde também é atravessada por condições sociais. Já Hebe destacou o quanto o esporte sempre chamou sua atenção, justamente por ser a forma como a mãe vendia sua FT em diferentes empregos, sendo que ela mesma a acompanhava nesses contextos – sem, no entanto, problematizar as exigências de cuidado e trabalho impostas à sua mãe.

A influência do esporte na escolha de acadêmicos(as) de EF já foi demonstrada no estudo de Razeira et al. (2014), que revelou que 69,7% dos(as) participantes relacionaram o gosto pelo esporte à escolha do curso. No entanto, esse estudo não segmentou as respostas por sexo, o que impossibilita uma relação mais direta com os achados desta pesquisa. Ainda assim, destaca-se a relevância do esporte no contexto de formação e atuação em EF.

Ressalta-se que a EF engloba uma ampla diversidade de conteúdos vinculados à cultura corporal, que reflete o movimento humano como uma necessidade histórica para a manutenção da vida. Por exemplo, a prática de nadar originou-se da sobrevivência em meios aquáticos, a corrida da fuga de predadores, e ações como saltar e se pendurar eram vitais em tempos remotos. Esses movimentos foram aprendidos com base nas condições materiais de cada época. Da mesma forma, atividades como jogos, dança e ginástica, criadas pelo ser humano, não são inatas e, portanto, precisam ser ensinadas e transmitidas às gerações futuras (Soares et al., 1992).

No entanto, a condição esportiva, valorizada e inserida no contexto do MPC, não surge com o objetivo de promover conhecimento à classe trabalhadora, mas como parte de um processo que naturaliza a exploração. Assim, o esporte consolidou-se

como conteúdo hegemônico na EF após a 2ª Guerra Mundial, conforme Oliveira (2010), em um período marcado pelo fim do Estado Novo e pelo avanço da industrialização e urbanização no Brasil.

Esse contexto possibilitou que a prática esportiva fosse incorporada às aulas de Educação Física como uma ferramenta de manutenção do MPC, ainda que sua criação original não tivesse esse objetivo de forma explícita. Nesse cenário, a participação esportiva das mulheres foi gradualmente ampliada, mas sempre dentro dos limites impostos pelo sistema sexo/gênero. A democracia capitalista, ao naturalizar a exploração da FT das mulheres da classe trabalhadora, abriu algumas oportunidades de inserção, mas sem romper com as obrigações historicamente atribuídas a elas pela divisão sexual do trabalho. Essa realidade aparece nas falas de Íris e Hebe, que reforçam a centralidade da figura materna como principal responsável pelo cuidado dos filhos – seja na gestão da saúde, seja na organização do tempo livre das crianças.

Por isso, compreende-se que a simples assalarização das atividades de cuidado não eliminaria as responsabilidades historicamente destinadas às mulheres, como sugere Federici (2017, 2021) ao formular o conceito de “patriarcado do salário”. Tal perspectiva diverge dos fundamentos marxianos, pois:

[...] o dinheiro é apenas um instrumento, não a origem da expropriação capitalista. Federici argumenta que a falta de remuneração do trabalho reprodutivo seria a causa da submissão das mulheres e sugere que assalariar esse tipo de trabalho seria a solução para a libertação feminina. Entretanto, essa proposta não reflete a realidade, já que as mulheres permanecem oprimidas e sobrecarregadas pelo trabalho de reprodução mesmo quando assalariadas e financeiramente independentes. O MPC utiliza o patriarcado para reforçar estruturas ainda mais profundas de opressão das mulheres pelos homens, mostrando que a mera inclusão salarial não é suficiente para eliminar essa dinâmica (Ramalho, 2024, p. 39).


Diante disso, a emancipação das mulheres não poderá ser alcançada por meio de reformas pontuais ou ajustes internos ao próprio MPC, já que tais medidas apenas geram mudanças superficiais, mantendo intactas as bases exploratórias que sustentam o sistema e suas opressões de gênero. Esse controle sobre as possibilidades de vida das mulheres, mediado pelo sistema sexo/gênero, aparece com nitidez nas falas das docentes entrevistadas:

A mulher tinha muito preconceito com relação aos esportes, por exemplo, eu adorava jogar futebol, mas só joguei futebol na faculdade porque era muito discriminada, quando me formei eu já tive mãe de alunas chegando na escola falando que a filha não ia jogar futebol na minha aula (Bia).

Mas é um curso que a princípio se a gente for pegar o histórico de formação do curso que eu entrei é um curso marcado né?! Até porque o esporte é... o acolhimento da mulher no esporte é bem recente, né. Se a gente for pensar pelo curso, é um curso marcado pelo sexo masculino (Heras).


As falas das entrevistadas evidenciam que a imposição de comportamentos sociais está profundamente enraizada na materialidade do corpo sexuado. Como fêmeas, espera-se que adotem gestos, escolhas e práticas consideradas “femininas”, caracterizando o sistema sexo/gênero como uma forma significativa de opressão na organização do MPC.

A orientação sexual, por sua vez, é socialmente determinada com base no sexo e se relaciona com o que Marx (2017) apontou sobre a criação e manutenção de um quantitativo adequado de trabalhadores(as) para regular o mercado de compra e venda de FT, desvalorizando da FT das mulheres e favorecendo a organização da divisão sexual do trabalho, favorecendo a classe dominante. Isso resulta na imposição da heterossexualidade (relações entre sexos diferentes) como padrão social, discriminando outras possibilidades de relacionamento.

As atribuições definidas pelo sexo estabelecem papéis sociais que contribuem para a hierarquização e expropriação, alinhando-se às demandas do MPC.

A vivência esportiva, cooptada pelo MPC, muitas vezes reforça os estereótipos das opressões de gênero através de uma prática pedagógica da EF acrítica, reproduzida em escolas e espaços que perpetuam essas dinâmicas. Esse contexto reflete justificativas, frequentemente acadêmicas ou sociais, que legitimam e reforçam o cerceamento de determinadas práticas da cultura corporal para as mulheres.

O suor excessivo, o esforço físico, as emoções fortes, as competições, a rivalidade consentida, os músculos delineados, os gestos espetacularizados do corpo, a liberdade de movimentos, a leveza das roupas e a seminudez, práticas comuns ao universo da cultura física, quando relacionadas à mulher, despertavam suspeitas porque pareciam abrandar certos limites que contornavam uma imagem ideal de ser feminina. Pareciam, ainda, desestabilizar o terreno criado e mantido sob domínio masculino cuja justificativa, assentada na biologia do corpo e do sexo, deveria atestar a superioridade deles em relação a elas (Goellner, 2006, p. 92, grifo nosso).

Compreender o sistema sexo/gênero como uma dimensão indissociável das perspectivas social e biológica ajuda a elucidar que as mulheres não são apenas corpos, nem unicamente construções sociais (Izquierdo, 2022). Essa construção social está ancorada na materialidade do corpo, onde as funções biológicas são apontadas como justificativas para reforçar as características sociais. Embora Goellner (2006) não tenha explicitado a análise do sistema sexo/gênero, este oferece uma perspectiva precisa para interpretar os desafios enfrentados pelas mulheres no esporte – um sistema historicamente estruturado em benefício dos homens. A articulação entre base biológica e contexto social explica, por exemplo, por que alunas como as da entrevistada Bia eram impedidas de praticar futebol em suas aulas de EF escolar. A própria Bia só teve contato com o esporte ao chegar na universidade. Os marcadores sociais definem trajetórias possíveis, mas estão profundamente enraizados na base material.

O movimento das ações e fatos é dinâmico, coeso e contraditório. Embora a participação das mulheres no esporte seja benéfica, ela está inserida em um contexto que também serve como ferramenta do MPC. Na fase atual desse sistema, marcada pela redução de direitos trabalhistas e pelo fortalecimento da ideologia da meritocracia, a proibição explícita de determinadas práticas poderia expor as contradições internas do modo de produção. Assim, o controle social se dá por meio de mecanismos mais sutis, evitando restrições explícitas, mas reforçando práticas subjetivas que limitam a autonomia.

As mulheres conquistaram o direito de praticar atividades esportivas, mas as desigualdades permanecem evidentes. No futebol, por exemplo, as jogadoras recebem salários significativamente inferiores aos dos homens, e, no handebol de praia, as atletas são obrigadas a expor seus corpos, enquanto os homens têm a liberdade de usar roupas mais confortáveis. Embora a construção de ideais e discursos de igualdade não altere diretamente a realidade material, ela exerce influência sobre suas dinâmicas.

Apesar dessas contradições, a prática esportiva entre mulheres tem crescido significativamente. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o percentual de mulheres que praticam atividade física aumentou de 22,2% em 2009 para 31,3% em 2021 (Brasil, 2022). Esse crescimento reflete não apenas uma maior presença delas em atividades físicas e esportivas, mas também

sua ocupação mais ampla em espaços públicos, acompanhando o aumento de sua participação como população economicamente ativa.

Tenoury, Madalozzo e Martins (2021) apontam que a taxa de participação das mulheres na FT passou de 18,5% em 1960 para 52,9% em 2018. No entanto, dentro do contexto do MPC, a divisão sexual do trabalho ainda regula a venda e compra de FT, vinculando às mulheres a opressão de gênero, marcada socialmente pela imposição do trabalho de cuidado.

A cobrança do trabalho reprodutivo sobre as mulheres também é evidente em relatos de atletas de alto rendimento, especialmente em relação à maternidade. O corpo das atletas profissionais é associado diretamente à lógica de eficiência, o que impõe dificuldades adicionais às mulheres, em razão das construções sociais de gênero. Algumas atletas, ao engravidarem – seja de forma planejada ou não –, foram demitidas de seus clubes (Olimpíadas UOL, 2016), revelando o conflito entre exercer a maternidade ou vender sua FT.

Esses exemplos mostram como a dialética expõe as cobranças sociais impostas às mulheres trabalhadoras pelo sistema sexo/gênero, em uma democracia capitalista onde a emancipação é limitada pela exploração de uma classe sobre outra. Esse sistema se sustenta também em opressões baseadas em marcadores biológicos, como o sexismo e o racismo, que buscam fomentar e justificar hierarquias em um modo de produção classista e exploratório.

Embora as docentes pesquisadas tenham vivenciado experiências esportivas positivas que influenciaram sua escolha profissional, é essencial compreender o contexto em que essa escolha, que viabiliza a venda de FT para seu sustento, ocorre. O MPC é estruturado por relações sociais, e entender sua complexidade requer relacionar os contextos estruturais às escolhas individuais que são efetivamente possibilitadas. Essa perspectiva é indispensável para revelar as opressões e explorações que sustentam o sistema.

Por fim, esse recorte demonstra como o macro se consolida em ações individuais, embora essas ações não ocorram de forma autônoma ou isolada.

Considerações finais


Este estudo evidenciou como o esporte influenciou a escolha profissional das docentes universitárias de EF em uma universidade pública no Norte de Minas Gerais,

destacando a importância das experiências positivas vividas por essas mulheres no contexto esportivo. A análise das entrevistas revelou que o esporte, ao se integrar às suas trajetórias de vida, proporcionou um caminho de realização profissional que, em outras circunstâncias, poderia ter sido inacessível. Além de possibilitar ascensão profissional, a prática esportiva serviu como um espaço de socialização, especialmente por meio do esporte recreativo (Castellani Filho, 2013).

Todas as professoras que relacionaram o esporte à escolha de sua formação acadêmica relataram memórias e experiências positivas. No entanto, suas justificativas não expressaram uma análise crítica sobre a estrutura do esporte em si, o que pode contribuir para a reprodução das práticas esportivas conforme difundidas pelo MPC. Ainda assim, garantir que as mulheres tenham acesso a diversas experiências esportivas é fundamental para ampliar suas possibilidades de atuação em áreas historicamente ocupadas por homens. Em uma sociedade que ainda privilegia os homens em detrimento das mulheres, é essencial fomentar a ocupação de espaços que, durante séculos, lhes foram negados.

Por outro lado, embora o esporte tenha ampliado oportunidades e direitos, essa inserção ainda ocorre em um sistema que impõe barreiras e limitações às mulheres, sobretudo por meio do sistema sexo/gênero e da divisão sexual do trabalho. O capitalismo contemporâneo, ao permitir uma maior presença das mulheres nos esportes e em outras áreas, utiliza essas conquistas para regular o mercado de trabalho e manter a exploração da FT delas, especialmente em função das particularidades biológicas atribuídas a seu grupo sexual (Marx, 2017). Assim, mesmo com avanços, as mulheres continuam a enfrentar desigualdades salariais e sobrecarga de trabalho, principalmente devido às responsabilidades sociais impostas ao trabalho reprodutivo.

As relações sociais são complexas e contraditórias, marcadas pela luta de classes, que se manifesta de forma contínua e ininterrupta no MPC. Dessa forma, não se pode atribuir unicamente ao MPC a inserção oficial das mulheres no esporte, pois essa conquista foi resultado de lutas e resistências. No entanto, o sistema capitalista tende a absorver e reconfigurar essas forças contrárias a seu favor sempre que possível, como Marx aponta:

Os homens [e as mulheres] fazem a sua própria história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhes foram transmitidas assim como se encontram (Marx, 2011b, p. 25).


Dessa forma, a análise MHD permite compreender as aparentes objetividades dentro de seu contexto macroestrutural para alcançar a realidade concreta. Identificar a raiz do problema é essencial não apenas para a compreensão das dinâmicas sociais, mas também para promover uma transformação consciente. A inclusão das mulheres nos espaços esportivos, apesar de representar avanços, ainda ocorre dentro dos limites estabelecidos pelo MPC e pelo sistema sexo/gênero.

Para que o objeto desta pesquisa – a relação entre esporte e mulheres no MPC – seja abordado de forma crítica e revolucionária, é fundamental que a consciência feminista e de classe norteie essa análise. Não haverá emancipação das mulheres sem a emancipação social, pois, dentro de um modo de produção que explora, as opressões funcionam como instrumentos de fortalecimento desse sistema.

Assim, este estudo defende que a abolição das classes sociais é condição necessária para a abolição do gênero, de modo que o sistema sexo/gênero deixe de ser um mecanismo de perpetuação das desigualdades impostas às mulheres proletárias, como a divisão sexual do trabalho.


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